Minha mãe engravidou aos 16. Quando pariu, já com 17, papai tinha 19. E até eu reconhecer e exercitar a minha própria história, minha vida foi baseada nessas informações.
O norte do meu futuro era uma placa escrito “faça diferente.” Cresci andando em direção a ela sem olhar em volta para as outras possibilidades (se é que elas existiam) e sem me perguntar o que eu queria e gostava de verdade.
Estudei em escolas públicas do bairro até chegar no ensino médio e entrar no Colégio Pedro II, que apesar de uma reprovação, um abandono de curso e zero amigos (muito por culpa minha), foi um divisor de águas na minha vida e me possibilitou entrar na faculdade.
Diferente do que eu esperava e do que eu via nas pessoas da minha idade, esse momento da vida não teve emoção. Lembro de ter chorado quando vi meu nome aprovado, mas não de felicidade e sim de alívio por não decepcionar minha família.
No fundo, sempre soube que meus pais abraçariam minhas escolhas, mas o que eu queria mesmo era ter ouvido com todas as letras que mudar de ideia e se perder no caminho não era nem errado, nem um motivo de vergonha. Ouvir deles e do mundo. Não ouvi. E assim passei anos na faculdade de economia.
Escolhi o curso pensando no mercado de trabalho e na facilidade com as matérias da grade. Minha mãe se formou em pedagogia e eu tinha em mente que, por mais apaixonada pela profissão que ela parecesse (e parece) ser, a área da educação não era um caminho que me daria o retorno que eu precisava. E digo que eu precisava não por ser uma pessoa com grandes aspirações financeiras, mas porque eu precisava ter um caminho diferente dos meus pais, ou seja, eu precisava ter um caminho menos pobre.
Os anos que passei na UFF me trouxeram bons aprendizados, mas não me trouxeram felicidade e eu demorei um tempo para assumir em voz alta que tinha escolhido uma faculdade que não me fazia feliz.
Inicialmente, existia uma falsa satisfação em ser uma jovem negra que corria de salto no pé e cafézinho na mão. Afinal, não foi essa a ideia de sucesso que foi vendida para a gente? Mas depois de perguntas como: "quando foi que eu passei a querer isso?", "vale vencer sozinha?", "será que eu gosto mesmo de correr de salto no pé e cafézinho na mão?", descobri que boa parte das minhas escolhas vieram de projeções e não da autodescoberta.
Não quero que você largue a faculdade, peça demissão ou tome qualquer decisão do tipo. O capitalismo é a peste e o Brasil nem de longe é um país gentil com pessoas pobres e negras. Falta tempo para se humanizar quando é preciso comer, pagar as contas e ter uma vida diferente dos que vieram antes. Só quero te escrever o que adoraria ter ouvido: mudar de ideia e se perder no caminho não é nem errado, nem um motivo de vergonha.
Minha profissão atual? Não importa. Ainda estou me descobrindo e tenho guardado esse processo comigo.
Estudar e trabalhar segue sendo cansativo.
Segundas não passaram a ser divertidas.
Mas eu me sinto mais feliz, mais permissiva com as mudanças e desejo que você sinta isso também.
Até sexta-feira. Qualquer uma delas. Sem pressão. Apenas acompanhe essa fuga.
Beijos,
Lare.
Como eu precisava ler isso!!! 🥺 obrigada
obrigada por voltar